Não apoiei a greve iniciada pelos
caminhoneiros por três simples motivos, a saber:
1 – Os caminhoneiros não têm
tanta força quanto supõem ter e se divulga. Não vi na imprensa nenhum
comentário nesse sentido, pois ficou clara a força de paralisação. Com uma
campanha iniciada não sei por quem, mas inflamadas por mensagens e lideranças
difusas, o país ficou estático e atônito. Faltou combustível, alimentos,
remédios, insumos hospitalares, matéria prima, alimento para aves e animais,
bloquearam os portos, aeroportos e paralisaram transporte público entre outras
consequências? Sim, estrondosamente, sim! Mas isso é como vela acesa e
protegida, se autoextingue. O governo não poderia se omitir, mas se não fizesse
nada, absolutamente nada, como costuma fazer nas greves de professores, o fluxo
de transportes seria retomado automaticamente. Ocorre
que todo desabastecimento que nos atinge também atinge as famílias dos
caminhoneiros. Eles também têm pais que precisam de hospital, têm filhas que
precisarão da maternidade, têm parentes, filhos até, que perderão emprego e
seus próprios boletos não ficarão parado nas estradas, virão via internet e
eles terão que honrá-los. A própria população que, em sua maioria, faz uma
leitura diferente da situação, e em primeiro momento apóia a paralisação pois
está contra tudo o que aí está: preços altos, desmandos, corrupção, etc, a
partir de um certo momento será brutalmente penalizada e cada um vai defender o
atendimento à sua própria necessidade, além disso, grande parte dos
caminhoneiros, seja por entender que o foco não está correto ou por pura
necessidade, partirá para o confronto a fim de se deslocar para sua casa. Por
si só, esse movimento não duraria trinta dias.
2 – O foco está errado. A redução do
preço do diesel não ocorre por decreto. O preço é consequência, não causa.
Comprar a briga dessa maneira é como tratar de gripe com antitérmico e
analgésico, quando sabemos que esses são os sintomas, e o necessário é atacar a
causa com alimentação adequada, hidratação, repouso e, dependendo do caso, se
já atingiu ouvido e garganta, anti-inflamatório e antibiótico. O preço só
estará adequado se baixarem os juros e houver concorrência. Para baixar os
juros precisamos de um estado menor, que custe menos, que se renegocie a dívida
pública, enfim, o que não se faz do dia para a noite. Para haver concorrência
são necessárias medidas adequadas, o próprio CADE mostrou uma lista que faz
sentido, seria útil, mas por motivos eleitorais, não se falou na privatização da
Petrobras. Ninguém é doido de dizer isso publicamente em um período de campanha
eleitoral, mas deveriam. Privatizar a Petrobras
significa transferir propriedades, dívidas, equipamentos e até conhecimento,
mas não os campos de petróleo. Esses devem ser cedidos através de contratos
adequados, não vendidos. E pensando a longo prazo, o petróleo perderá a importância. Já há outras
diversas maneiras de se produzir energia renovável e a cada dia essas estão se
tornando mais viáveis, o que limitará a importância do petróleo a outros
produtos refinados, mas de menor produção.
O valor baixo do frete também tem
explicação. Em 2009 o governo Lula criou o PSI (Programa de Sustentação de
Investimentos) oferecendo crédito subsidiado através do BNDS para a compra de
caminhões e que poderiam ser pagos em até 8 anos. Entre 2008 e 2014 a venda de
caminhões cresceu 4,9% ao ano e o PIB expandia a uma taxa de 2,4% ao ano, ou
seja houve um excedente de 288.000 novos caminhões, o que fez com que o frete
caísse, 2,9% ao ano. O frete é baixo porque tem
muito caminhão. Para se tornar um caminhoneiro não é necessário ter o
refinamento de um médico, a precisão de um físico, o rigor de um filósofo,
precisa sim de alguma habilidade motora, o que a maioria da população tem, de um
nível de instrução básico e muita coragem e determinação. O que muitos têm,
enfim, apesar de ser uma vida difícil. Se tornar um caminhoneiro é fácil, é uma opção, e tem
muito! Ainda que muitos sejam honrados, distintos e necessários, outros nem tanto, a verdade é que a
concorrência é predatória.
Para não me estender muito nem comentarei
o erro estratégico sobre o modal de transportes.
3 – A paralisação deve ocorrer por livre
e manifesta vontade, não por imposição. Não concordo com o tempo que os médicos
me tomam na fila do consultório, como posso concordar com que alguém me impeça de
realizar qualquer atividade, por mais prosaica que seja, ainda mais quando o
direito de ir e vir é cláusula constitucional? Se houver um caminhoneiro queira
passar e ir para casa, ou que queira trabalhar, que seja livre para ir. Ele tem esse direito e tem que ser respeitado. Ele não pode ser obrigado a
permanecer onde não deseja. Não se pode bloquear estradas e, por benevolência,
deixar uma pista para veículos de passageiros; somente às autoridades competem,
em alguma circunstância, tomar esse tipo de decisão, não aos donos da greve. Onde já
se viu tamanha desfaçatez de civis parando caminhão para verificar a nota
fiscal, examinar a carga e decidir se permite ou não a passagem? Isso é crime!
Isso não é manifestação. Com criminoso não se deve ter complacência. É cadeia.
Essa paralisação expôs muita fragilidade.
A da nossa infraestrutura, a do nosso governo, a pouca compreensão, pela
população, da macro-situação. Além disso, causou grandes transtornos, provocou
perdas imensas, irá retirar verbas dos serviços essenciais como saúde e
educação, provocará um aumento no custo da gasolina, criou uma crise na
Petrobrás, que estava se recuperando, e não se garante que atingirá o
resultado. Os tais R$ 0,46 de desconto na bomba não é possível garantir. Será efêmera. Como o
governo fiscalizará mais de 38.000 postos existente? Com a promessa de multas,
suspensão, cassação e fiscalização? Isso não funciona nem aqui e nem na China.