domingo, 20 de maio de 2012

É Melhor Continuar Sendo Pobre.


      Nasci para ser pobre e por isso sou empregado. Apesar de possuir algumas habilidades que poderiam me proporcionar alguns pontos diferenciais em um negócio próprio não sei me portar como comerciante. Por outro lado isso me permite escolher as companhias e as amizades, o que não seria possível se eu dependesse do comércio para viver.

      Ontem saí de casa para ir ao banco, ao supermercado e falar com um amigo. Como todos os locais eram perto de casa fui a pé. Nós tínhamos um ponto em comum que era retirar o kit para participar de uma corrida hoje e ele já havia combinado com uma terceira pessoa para irem até o local e me convidou. Sabe aquela sensação de não querer aceitar, mas pela circunstância se vê envolvido? Pois é, foi o que fiz. Eu já havia estado com esse rapaz, de cerca de 35 anos, umas duas ou três vezes, mas nunca havíamos conversado.

      Ao entrar em seu carro, um ágil fiatizinho 1400 ou 1600, o meu amigo disse, vocês dois que são engenheiros vão na frente pois podem conversar, e ele prontamente retrucou, hoje é sábado e eu não converso sobre trabalho. Apenas para participar eu disse que era dia de descanso. Não havíamos percorrido nem 400m e ele em uma manobra ousada, mas não tão arriscada, ultrapassou dois carros, e o meu amigo comentou: você dirige agressivamente e ele respondeu: agressivamente não, eu sou esperto. Veja: eles estão abaixo da velocidade permitida e em fila, um passou pelo semáforo e o outro ficou. E continuou a dar lições de trânsito justamente para mim, que me considero um bom e experiente motorista. Eu comentei que ele deveria respeitar os ciclistas, e o esperto respondeu: se eles me respeitarem tudo bem, do contrário eu também não os respeitarei. Se um deles atravessar o sinal vermelho eu o jogo do outro lado da rua. Comentei que existe uma outra lei que diz que não é permitido matar e a regra de trânsito diz que o mais forte deve proteger o mais fraco.

      Essa conversa não iria terminar. Ao sairmos pela avenida São Carlos e entrarmos na rodovia Washington Luiz na direção da capital há um pequeno aclive no qual transitava um gol 1000 que sendo conduzido por um motorista, no mínimo, desatento. O esperto logo tomou a mão da esquerda o que daria a ele a prioridade na ultrapassagem, mas o motorista do gol, em uma manobra imprevidente, ainda que sem risco, saiu para a esquerda. Era uma situação perfeitamente administrável, pois havia distância segura e a diferença de velocidade não era tão grande, mas o esperto deixou para frear na última hora, enfiou a mão na buzina e deu repetidos sinais de luz. Não contente, quando o outro retornou para a faixa da direita, o esperto passou gesticulando, buzinando, xingando e eu morrendo de vergonha.

      Veio então uma enxurrada de justificativas do tipo, se não sabe dirigir, que não saia de casa. Se não está preparado, que não pegue a pista. Se fosse um caminhão teria passado por cima. Se ninguém falou nada para ele alguém tem que ensinar e agora ele vai aprender. Logo à frente ele teve que reduzir a velocidade e justificou, aqui eu diminuo porque tem o posto de guarda e tem radar. Não me contive: você está errado, você deve diminuir a velocidade não por causa do guarda ou do radar, mas porque é a velocidade que a lei determina. Ele desconversou e percebi que era o momento de eu me calar. Apenas o respeito ao meu amigo que me convidou me fez não pedir para descer e voltar a pé para casa, uma situação que a minha condição física perfeitamente me permite.

      Chegamos ao local, pegamos os kits, voltamos e não comentei mais nada. Apenas me despedi e agradeci, mas essa é uma companhia que não quero e uma amizade esperta que não desejo. É melhor continuar sendo pobre.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Que Deselegância!


      Sou torcedor do São Paulo e às vezes me pego em discussões intermináveis e inúteis sobre futebol, mas na política sou militante do PC – Partido do César, e voto de acordo com as minhas convicções. Sou a favor da democracia e da justiça social, mas entendo ser justo que cada um possua de acordo com a sua condição e capacidade. Não acredito no estado mantenedor e muito menos tutor das pessoas, cabe ao governo a tarefa de criar condições para que todos possam se desenvolver, apenas isso. Por isso não voto em partidos, mas em pessoas que naquele momento eu acredito que possam fazer a diferença. Já acertei e errei, isso faz parte do processo.

      Não gostei da administração Lula. Ele acertou no que não interveio, como na economia, mas errou naquilo que igualou o PT aos demais partidos, como no mensalão e outros desmandos. Com a sua carismática liderança deixou a desejar na transformação do país. Não basta jactar-se com estatísticas econômicas, o que faltou foi institucional. Foi moralizar o serviço público e as atividades políticas. No momento, apenas ele tem cacife político para tal empreitada.

      Por conseqüência também não ando apreciando a administração da Dilma. Obrigada a aceitar a carga de um ministério inadiministrável e incompetente foi nos dois primeiros anos de seu governo obrigada a debelar as crises denunciadas pela imprensa, além do que, como as ondas demoram para atravessar o Atlântico, a crise econômica ainda não chegou aqui, mas é questão de tempo. A inflação está represada, pois não se contém preços, como o dos combustíveis, ou os juros por decreto ou no berro, mas com atitudes, como reduzir o tamanho do estado e tornar a administração eficiente, mas essa semana devo elogiá-la e defendê-la.

      Ainda que não tenham sido do executivo, duas proposições tornaram-se leis, foram sancionadas pela presidente e passaram a ser efetivas a partir dessa semana. A lei do acesso às informações, que permitirá que sociedade tenha acesso aos documentos não sigilosos do governo, e se o Supremo Tribunal Federal deixar, até mesmo conhecer os salários dos servidores. E a instalação da Comissão da Verdade. Apesar do longo prazo despendido para a sua instalação, essa me pareceu equilibrada e capacitada para esclarecer os crimes praticados tanto pelo governo quanto por militantes durante o período da ditadura militar. É claro que a perda de qualquer vida é um custo impagável para a família e não se justifica, mas se comparado aos demais países sul americanos o Brasil deve muito menos explicações. Para a efetiva entrada em vigor das duas leis valeu o esforço pessoal da presidente e isso é elogiável e ela será lembrada por isso.

      Incompreensível foi a atitude de parte dos prefeitos que reunidos em Brasília vaiaram a presidente após a sua manifestação sobre o controverso tema da distribuição dos royalties do petróleo. Ao afirmar que seriam perdidas nos as ações que fossem impetradas contra a distribuição já contratada, parte da platéia vaiou a presidente, e isso não se faz. É nosso direito discordar da opinião dela, mas vaiá-la em cerimônia oficial é uma tremenda falta de educação, de elegância, e de civismo. Não se espera de autoridades atitudes típicas de torcida ou de militância. Por mais que discordemos, não podemos desmerecer a importância e a autoridade da instituição da Presidência da República. Ela foi democraticamente eleita para tomar, em nosso nome, as decisões. Sim, porque governar é fazer escolhas e tomar decisões, e é isso que ela está fazendo, gostemos ou não, aprovemos ou não, e daqui a 2 anos teremos oportunidade de reconduzi-la ao poder ou substituí-la, assim é a democracia.

      A atitude dos prefeitos é uma amostra perfeita e acabada do nosso nível de educação, ou seja, estamos muito mal.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Ah, as cotas!


      Contra decisões do Supremo Tribunal Federal não cabem recursos, acata-se o resultado, e essas podem ser utilizadas como referência em processos futuros ou em tramitação em que matérias de mesmo teor estejam sendo apreciadas. Na semana passada, por unanimidade, ou seja, por dez votos a zero, o STF considerou legal a adoção pela Universidade de Brasília das cotas raciais para ingresso em seus cursos. Assim 20% das vagas são reservadas para quem se declare negro, pardo ou índio. Com as divagações filosóficas e palavreados rebuscados de sempre, um a um, os ministros proferiam os seus votos, o que resultou na consideração de que o estado tem o dever de reparar a injustiça histórica da distribuição de renda no país.

      Embora correta no teor me parece que a sentença está errada na forma, pois a compensação se dará às custas da promoção da própria desigualdade racial, isso é, existe um racismo ao contrário. Ao se reservar cotas aos mais carentes estabelecendo-se como critério a raça, tira-se dos demais a possibilidade de concorrer também nessa parcela, o que, a meu ver, afronta a própria constituição, pois segundo essa todos somos iguais, e consequentemente temos os mesmos direitos. Um rico que seja considerado negro pode concorrer ao ingresso utilizando-se das cotas enquanto um branco pobre é obrigado a disputar a vaga com a maioria. Estabeleceu-se assim o racismo patrocinado pelo estado.

      De certa maneira essa distorção já é considerada quando se cobra mais impostos daqueles que tem mais posses, e se isso ainda não é suficiente, que sejam distribuídas bolsas para custear o ensino superior ou mesmo o ensino básico para os mais carentes. Creio que o critério econômico é mais justo do que o racial, pois querendo limitar o acesso dos mais ricos está se excluindo também os brancos pobres. Embora o número de pobres seja maior na população de raça negra, ele não é pequeno na de raça branca, e esses também necessitam e devem ter o apoio do estado.

      Não podendo, o governo, resolver todos os problemas da população, esse deveria estabelecer como prioridade a criança, que independente de raça, credo ou condição social deveria contar com segurança, saúde e educação integrais e de boa qualidade desde o ensino infantil. Em pouco mais de 15 anos teríamos uma sociedade muito mais educada e preparada para escolher as suas profissões e exercer o seu potencial, e mesmo que vários ministros tenham deixado claro que a medida deve ser transitória, não foi determinado nenhum limite, assim a medida tende a se tornar perene e a sociedade continuará dependendo de bolsas sem que a redução da desigualdade seja efetiva.

      Se a adoção de cotas para ingresso em universidade fosse a solução, porque então não estabelecemos cotas para ministros do próprio tribunal? Que tal então cotas para a presidência da república? Desde a proclamação em 1889 tivemos, salvo em períodos de exceção e o caso do presidente Tancredo que não assumiu, 36 presidentes, por que então não fazer com que próximos 36 presidentes sejam negros?